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sábado, 16 de janeiro de 2010

Uma homenagem póstuma


Estou aqui hoje para fazer uma homenagem póstuma à Pietra e ao Pierre. Dois pequenos e frágeis seres que passaram por aqui e não conheceram outra coisa que não fosse o sofrimento causado pelas mãos do ser humano. Não conheceram o afeto, não souberam o que é ter um lar e um dono. Nasceram na rua, são os verdadeiros filhos do abandono. Nasceram de pais também abandonados na rua ao sofrimento ou de pais que possam até ter tido donos, mas donos que permitiram que suas crias fossem geradas por covardia de enfrentar (ou pagar ou procurar) por cirurgias de castração por acreditarem de forma ignorante que o ato equivaleria à mutilação. Não permitiram o que chamavam de `mutilação`, mas permitiram que os filhotes fossem mutilados ao serem cruelmente arrancados e jogados na rua, doados aleatoriamente a qualquer um.

Pietra, em seu primeiro cio, estava à beira de levar adiante este ciclo de abandono. A despeito da magreza absurda, de sua delicadeza típica de fêmea, da fragilidade e das dores no corpo provocadas por chutes e pedradas desferidos pelo ser humano, ainda tinha de conviver com filas de machos que a perseguiam para acasalar atraídos pelo odor de seu cio.

Pierre não era o único macho que cercava Pietra. E tinha de encontrar forças para vencer os concorrentes, enfrentando, além dos perigos da rua, o monstro da fome e o monstro ser humano, capaz das maiores covardias contra os cães que sujavam as ruas e deixavam marcas na consciência do ser humano que abandona, que maltrata, que fere, que mata, mas que não quer ser lembrado de seus atos pela presença onipresente de cães abandonados circulando pelas ruas da cidade, em frente às suas casas.

Pietra e Pierre, filhos do abandono e, como se não bastasse, filhos do preconceito. Explica-se: legítimos SRDs, ou seja, cães sem raça definida, ou em bom português, vira-latas, eram, a exemplo de outros tantos vira-latas Brasil afora, rejeitados, rechaçados pelo ser humano que esconde suas hipocrisias e defeitos atrás do status proporcionados por marcas, inclusive, marcas de cachorros, gatos e cavalos, bichos de estimação. Raças ganham projeção nas telas da TV e do cinema, nas páginas dos livros, e invadem lares de famílias que pagam fortunas a criadores para terem os exemplares famosos dentro de suas casas e quintais. E, com o tempo, perdem terreno e o afeto afetado por influências externas de seus donos, são largados à própria sorte, maltratados, abandonados nas ruas ou doados com a desculpa esfarrapada de que seus donos, cansados e de olho em outras novidades capazes de lhes garantir status perante à sociedade descartável, não têm condição de criá-los mais - um dos muitos requisitos básicos que deveriam ter sido pensados e avaliados lá no começo, logo que se trouxe o animal para a casa.

À vocês, Pietra e Pierre, que se deleitaram com o primeiro e último regalo de suas vidas, uma latinha de patê próprio para pets, sem sequer imaginarem que daí a poucas horas seriam sedados e adormeceriam para sempre. Â vocês que sequer nome tinham, chamados simplesmente de cachorros, e que nos instantes finais receberam nomes para preencher as fichas de cadastro na clínica veterinária: Pierre e Pietra - que, a princípio, era Nina. À vocês, o meu pedido de perdão por ter tomado uma decisão que se mostrava como única saída diante dos resultados dos exames e à minha total incapacidade de encontrar alguém disposto a cuidar de vocês de forma especial, segundo critérios indicados por veterinário, ao longo de toda a vida de vocês que poderia ser longa se não tivesse que ser abreviada. À vocês, vítimas de uma doença cujo tratamento não é reconhecido pelo Ministério da Saúde, a leishmaniose, certamente para que o Estado não tenha de assumir no orçamento os custos de mais uma vacina contra zoonose, a exemplo do que é feito quando são abertas as campanhas de vacinação anti-rábica.

À vocês, o meu sincero pedido de perdão e a minha despedida em forma de homenagem póstuma. Que no lugar onde vocês estejam agora despertados sejam respeitados como sequer um dia foram por aqui, na terra habitada por seres humanos. Fiz por vocês tudo que estava ao meu alcance e é com tristeza que reconheço minha falha, minha incompetência e minha incapacidade de evitar a partida tão breve de dois seres que poderiam ter tido vidas longas. Um dia a gente se encontra novamente.

Um comentário:

  1. Oi Nádia, aqui é sua amiga, Cristina. Veja bem, quando li o seu texto me sensibilizei muito, principalmente porque há pouco tempo estou nesta luta contra o desprezo aos animais e já me sinto uma velha combatente de guerra, cansada, um pouco desanimada... Essa semana, a Zeppelin fugiu daqui de casa. Deve ter saído atrás de mim quando fui trabalhar. Sem desistir por um segundo, encontrei-a no dia sgeuinte no Morro do Papagaio, sozinha, linda... Agora ela está aqui comigo de novo, esperando melhorar os exames para procedermos à castração. Mas, quando eu estava à sua procura, resgatei um outro (que preferi não colocar nome sequer para cadastro) que pareceu-me MUITO doente. Era filhotinho, dez meses mais ou menos, segundo a veterinária.

    Dois dias depois de internado, o exame de leish deu reagente. Fiquei pensando no seu texto, na raiva do Poder Público e na desesperança de isso mudar, pois além do desvio de verbas, há uma "prioridade" na lista de ações do governo e, com certeza, o tratamento de doenças caninas (ainda que perigosas para o ser humano) não está no topo. Vão resolver muitas outras questões, de cunho "campanha política" antes de pensarem nos animais de toda espécie.

    Enfim, com o memso pesar, tive que autorizar a eutanásia dele. Pensei: se já está difícil conseguir bons lares para cães em perfeito estado de saúde, imagina para um doente?! Quem vai acompanhá-lo com todas as despesas, preconceitos e demanda por atenção?

    Fica aqui meu sentimento solidário a você, no momento difícil que você atravessou e a certeza de que precisamos nos unir.

    Um abraço

    Cris

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